Simples feito o amanhã

sexta-feira, 28 de novembro de 2008



Sentada junto à janela, olhando a chuva que cai sem cessar, ela pensa.
Horas correm enquanto lágrimas caminham lentamente em sua face.
Seu rosto já não é belo como antes, ela percebe ao tocá-lo enquanto o enxuga.
Seu cabelo já não tem o mesmo brilho.
Seus olhos agora a enganam e aquilo que outrora fora lindo ficou pra trás.
O tempo levou...
O ritmo de suas memórias ainda é intenso;
Mas a cada lembrança um soco subconciente a acerta tal qual faria um pugilista.
Memórias...
Imagens...
Pais, filhos, netos, sobrinhos, irmãos, irmãs, namorados, marido, crianças, imagens de um tempo em que tudo era flores.
Flores hoje acinzentadas, cicatrizes já esquecidas.

Sentado junto à janela ele vê o sol nascer.
Algo comum pra quem não consegue dormir.
A insônia, vilã dos que se cansam é sua companheira das madrugadas
E enquanto todos se preparam para um novo dia ele simplesmente deseja dormir.
Mas quem consegue dormir com a cabeça a estourar?
Por entre o vidro da janela ele vê um sofrido Cristo de braços abertos frente ao mar.
Imagens de pessoas em alvoroço a correr e a gritar...
Dores tomam-lhe o corpo, rápidas e quentes como uma bala
E enquanto o fim não chega ele sente mais uma vez o cheiro da bruma.
Ouve-se o mar, sente-se o orvalho da manhã.
Mais uma vez o Cristo parece estar lhe observando, mas se o Cristo pode ver por que é que seus olhos estão tristes?
Agora ele se lembra por que foi parar naquele lugar,
Aquele não era seu lar
Essa não era sua cadeira
Aquela não era sua barba
Aquela não era sua roupa
Onde foram os amigos?
Cadê as garotas?
Os sorrisos, a música, a grana???
Um gesto e um estouro
E a bruma leva aquilo que era definitivo feito tatuagem.

Sentada junto à janela ela se desprende de suas lembranças e vê o jovem do outro lado do quarto que parece em desespero.
A única coisa que ela vê agora são as sequelas e a tristeza naqueles olhos.
E não vê quando o fim aparece em sua frente simples feito o amanhã.